Intencionalidade vs. Consciência (John Searle)

Intencionalidade não é a mesma coisa que consciência. Muitos estados conscientes não são Intencionais – por exemplo, um sentimento súbito de exaltação – e muitos estados Intencionais não são conscientes – por exemplo, tenho muitas crenças sobre as quais não estou pensando no momento e nas quais posso nunca ter pensado. Acredito, por exemplo, que meu avô paterno tenha passado a vida inteira no território continental dos Estados Unidos, mas até este momento nunca havia formulado ou considerado conscientemente esta crença. Tais crenças inconscientes, a propósito, não necessariamente correspondem a algum tipo de repressão freudiana ou de qualquer outro tipo; são apenas crenças que temos sem pensar nelas normalmente. Em defesa da opinião segundo a qual existe uma identidade entre consciência e Intencionalidade, costuma-se dizer que toda consciência é consciência de, que sempre que se está consciente há alguma coisa de que se está consciente. Esta explicação da consciência, porém, obscurece uma distinção crucial: quando tenho uma experiência consciente de ansiedade, há, de fato, algo de que minha experiência é experiência de, a saber, a ansiedade, mas esse sentido e “de” é bem diferente do “de” da Intencionalidade que ocorre, por exemplo, na declaração de que tenho um medo consciente de cobras; pois, no caso da ansiedade, a experiência de ansiedade e a ansiedade são idênticas, mas o medo de cobras não é idêntico a cobras. É característico dos estados Intencionais, da maneira como emprego essa noção, haver uma distinção entre o estado e aquilo a que esse estado está direcionado, ou sobre o que ele é, ou ainda de que ele é […]. Em minha explicação, o “de” na expressão “a experiência de ansiedade” não pode ser o “de” da Intensionalidade, pois a experiência e a ansiedade são idênticas. (SEARLE, J. Intencionalidade, Martins Fontes: São Paulo, 2002, pps. 2-3)

Livro:
Searle, Intencionalidade: ver na Livraria Cultura.

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