Ao longo dos três últimos anos monitorei o tempo que gasto com tarefas do trabalho (com esta ferramenta), inicialmente de modo mais amplo e depois apenas com foco em atividades relacionadas à pesquisa. Os objetivos iniciais do monitoramento combinavam um pouco curiosidade e busca de autoconhecimento, a necessidade de manter um registro para relatórios ao final do semestre e também uma pretensão de entender em que medida a atividade de pesquisa era compatível com a carreira de professor de um instituto federal.
Infelizmente, no período em questão, não monitorei o ciclo completo de nenhum trabalho (do início do planejamento à publicação) e por isso a pergunta do título ficará sem uma resposta mais direta. Mas os registros relacionados à revisão de dois artigos surpreenderam-me bastante e é com base neles que faço algumas considerações.
Em cada uma das revisões consideradas, tinha em mãos uma versão completa provisória de um artigo (já submetida a periódicos especializados) e, com base nas considerações de pareceristas dessas revistas, fiz revisões substantivas em cada um dos artigos. Essas revisões envolveram ler itens bibliográficos novos e repensar, reorganizar e reescrever porções substativas do texto. Uma das revisões levou cerca de 100 horas (artigo sobre reforma das práticas de responsabilização) e a outra levou aproximadamente 200 horas (artigo sobre a evolução dos juízos sobre responsabilidade). Noto que o primeiro artigo tinha uma trajetória anterior mais longa de elaboração e revisões que não foram computadas.
Embora haja relatos de trabalhos de filosofia que levam vários anos para serem elaborados e publicados, não encontrei relatos mais refinados sobre o tempo efetivamente empregado neles. Assim, essas observações poderão não ser representativas da atividade de outras pessoas. Mas, supondo que guardem algum grau de generalidade, podemos elaborar algumas considerações.
- Se a elaboração da versão inicial levar pelo menos o mesmo tempo do que uma revisão substantiva (apostaria que leva mais), então a escrita de um artigo somada a uma única revisão substantiva pode levar entre 200 e 400 horas de trabalho.
- Para alguém que trabalhasse 40 horas semanais dedicadas exclusivamente à leitura e à escrita, a escrita de um artigo levaria entre 5 e 10 semanas de trabalho.
- No Instituto Federal Farroupilha, onde trabalho, coordenadores de projetos de pesquisa dedicam (em princípio, segundo as normativas institucionais) 6 horas semanais a atividades de pesquisa, que incluem também atividades de orientação de estudantes, formulação de projetos e relatórios. Um pesquisador que conseguisse dedicar 5 horas semanais à leitura e à escrita levaria entre 40 e 80 semanas para publicar um artigo. Na prática, sem trabalhar em períodos de férias, o pesquisador conseguiria publicar um artigo a cada um ou dois anos, sem considerar que o trabalho fragmentado pode ser menos eficiente.
Apesar de limitadas e pouco generalizáveis, penso que informações com as acima são necessárias se quisermos tomar boas decisões nas esferas individuais, institucionais e mesmo em políticas públicas relacionadas às áreas de educação e pesquisa. Creio que não haja um entendimento coletivo na filosofia brasileira, por exemplo, sobre quão produtivo um professor de instituto federal ou de um programa de pós-graduação deveria ser em termos dos resultados de sua atividade. E creio que normativas institucionais como a que prevê seis horas semanais dedicadas a um projeto de pesquisa não estejam ancoradas em uma visão realista sobre as condições necessárias para o desenvolvimento dessa atividade. De modo ainda mais amplo, podemos levantar questões sobre o custo da atividade de pesquisa, sobre o que podemos esperar de estudantes de pós-graduação e de iniciação científica, entre outras. Os gregos já sabiam que viabilizar o tempo livre era condição necessária para a vida teórica.